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  • O aventureiro "Pedro Malasarte"

    05/11/2014

     Excessivamente humilde e introspectivo, sem vaidade alguma na vida, mesmo depois de exaltado por Machado, José Lins e José Américo, como um dos maiores romancistas da língua portuguesa, nunca experimentou o paraibano José de Araujo Vieira, quase desconhecido na atualidade, a glória literária que, certamente, ainda lhe deve o Brasil. A índole genuinamente desprovida de maldade e egoísmo afastou do portentoso escritor natural de Mamanguape, de sorriso triste e semblante bisonho, o menor sentimento de ambição, cerceando o estímulo de amigos e admiradores da estirpe literária de Carlos Dias Fernandes, Barbosa Lima Sobrinho, Manuel Bandeira e Valdemar Cavalcanti, em favor de seu prodigioso talento e divulgação de sua obra. Este último, por exemplo, a tal respeito, deu-lhe emblemático perfil, retratando-o como “um homem algo tímido, de fala mansa, ar de vencido, seco de gestos (...). Fazia questão de atravessar a cidade das letras sem acotovelar ninguém, indiferente aos cartazes, aos grupos, sozinho no seu andar pausado e macio (...). A imagem que dele me ficou foi exatamente essa – a do caramujo incapaz de qualquer arrebatamento. Do solitário. Do caladão.”. Toda uma vida de inglórios sacrifícios, marcada por dissabores pessoais os mais diversos, desde o berço paupérrimo a uma lacerante maturidade, não impedira a que, de obscuro guarda-livros em bibliotecas públicas, quando amealhara estupenda cultura, lograsse o estilista de linguagem límpida e impecável, no Rio de Janeiro, então capital da república, onde se radicou em busca de melhores condições, orbitar brilhante círculos culturais, inclusive como funcionário dileto da Academia Brasileira de Letras, mas também editar seus incríveis romances, cheios de psicologia e revelações da alma humana e com os quais ganhara até a reputação de “Gautier” de nossas letras. Despontara, assim, os originais e envolventes enredos de caráter universal, um após outro, livres do batido regionalismo do escritor nordestino, insertos em “Espelhos de casado”, “Romance da solteirice” e “Um reformador na cidade do vício” entre outros, porém saltando ao status de arte genial sobreveio, em 1944, “Vida e aventura de Pedro Malasarte”, sagrado, segundo o juízo da crítica contemporânea, dentre as obras primas da romanceria brasileira. Uma trama realmente fantástica, super imaginosa que, no entanto apenas, lhe deu, e ao travesso personagem, uma fugaz notoriedade, essa, na sua modéstia, sequer pretendida pelo autor, conforme dizeres de um biógrafo – “Não lhe seria difícil alçar-se a posições mais altas, ainda assim por direito de conquista. Não procurou esse caminho, o que escolheu conciliava com sua própria consciência. E isso lhe bastava!”.


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