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  • Salinger - A bizarra solidão de um consagrado

    07/08/2014

     Aclamado como um dos autores mais lidos em todo o mundo, nos últimos tempos, com apenas três livros publicados Jerome David Salinger saiu de cena, isolando-se completamente, no esconderijo de New Hampshire, até o final da vida, a impedir qualquer divulgação a seu respeito e até mesmo a venda milionária de direitos autorais da esplêndida obra.

    A despeito das críticas acerbas de eminências literárias suportadas, nos anos imediatamente seguintes à primeira edição, em 1951, o mais famoso livro do misantropo e bisonho escritor americano aos poucos atingiu imprevisto sucesso, traduzido a dezenas de idiomas, com ciclópicas e sucessivas tiragens por todos os continentes.

    A impactante surpresa, tão grande o gosto pela trama de “O apanhador no campo de centeio”, teria incutido no romancista, certamente ainda cético da magnitude de sua criação, o incorrigível receio de nunca mais produzir algo de mesma dimensão, equiparável ao estrondoso êxito inaugural.

    Na verdade a leitura do célebre romance, onde o próprio Salinger, transfigurado no personagem principal, enseja uma vingança quixotesca e retórica contra todos os que o fizeram se sentir alijado da sociedade, prende e arrebata, despertando um voraz interesse pelo desfecho da narrativa, até a última página.

    É bem possível que a febre avassaladora disseminada ao público leitor, tal como acontecera com aficionados de “Os sofrimentos do jovem Werther”, do grande e eterno Goethe, contenha o vírus alucinatório causador da onda de suicídios na Europa do século XVIII e oriundo do látego entre o desejo de uma vida intensa e livre, como a experimentada por Holden Caufield no campo da colheita, e um mundo citadino com suas agressivas e sufocantes regras sociais, destruidoras de sonhos e quimeras, afinal os verdadeiros amálgamas da felicidade.

    Continuando a vender milhões de exemplares por ano, em todas as regiões civilizadas do planeta, “O apanhador no campo de centeio” permanece a inspirar leitores angustiados, tornando-se, numa irônica reviravolta dos postulados originais, o guia mágico de depressivos solitários, melancólicos, psicopatas e até virtuais criminosos, como Mark Chapman, autor do assassinato de John Lennon, segundo o qual perpetrado sob a inspiração da polêmica novela.

    Sem jamais haver confessado os íntimos motivos da súbita aversão social e da irrevogável reclusão, rabugento, indisponível e inabordável o célebre escritor retirado – um dos maiores da literatura americana, em meio à insólita guinada da vida pessoal, segundo o relato da filha Margaret, continuara, entretanto, a escrever, dia e noite sem parar, até morrer, aos 91 anos, em 2010, deixando um sem número de manuscritos inéditos,

    expressamente proibidos à divulgação porque “tal atitude representaria terrível invasão” à sua privacidade e ao legado de suas memórias.


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