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  • O talento de João Lelis

    24/09/2013

     João Lelis de Luna Freire foi, indiscutivelmente, um dos mais notáveis paraibanos do Século XX, deixando, com essa marca, um nome emblemático no meio letrado e uma obra, de caráter social e antropológico, ainda hoje, admirada por sucessivas gerações.

    Notoriedade respeitável e merecida, conquistada desde a mocidade, por méritos inatos e, precisamente, esmerada desenvoltura, naturalmente, exibida nos múltiplos campos de sua fecunda e impressionante lida intelectual.

    Pertenceu esse iluminado rebento de Alagoa Nova a uma lendária estirpe de carismáticos homens públicos, na Paraíba de 1930. Era a escola de Carlos Dias Fernandes, em plena ebulição, sob a égide da velha “A União”, onde, em sua companhia, também cintilavam João da Mata, Osias Gomes, Ernane Batista, Botto de Menezes, Adhemar Vidal, Eudes Barros, entre outros idealistas e próceres do admirável causer.

    Lelis, a exemplo dos demais, inobstante falecido prematuramente, com pouco mais de quarenta anos, percorreu brilhante trajetória como professor, ensaísta, jurista e autor de vários livros. Foi também político, se destacando como Prefeito de cidades interioranas e parlamentar, no Legislativo estadual, de verbo temido e eloqüente.

    Porém, como jornalista se elevara à todos, ao escalar o altíssimo patamar de herói, reservado a poucos, quando aceitara a temerária missão de empreender a reportagem completa do conflito armado no Município de Princesa, encravado no Semi-Árido paraibano, cujo governo, naquela quadra, se proclamava independente da República.

    Ali, no palco remoto e hostil de uma luta encarniçada, durante sete meses, testemunhara, no epicentro, horrores indizíveis, redigindo a matéria noticiosa aos clarões e estrépitos dos intermitentes confrontos, sem a mínima assistência dos recursos técnicos, meios de transportes e de segurança da atualidade. Expondo, assim, a própria vida ao sacrifício, além da prova incomum de bravura, escreveu, com respaldo no tirocínio prodigioso, um capítulo inédito e angular na história paraibana.

    Tornou-se, portanto, com a proeza jamais igualada, no posto mais avançado e intimidante, o primeiro correspondente de guerra na Paraíba, à semelhança de Taunay em relação à retirada da Laguna e de Euclides da Cunha, ao embate de Canudos, transmitindo impressões e conceitos de profundo alcance sociológico sobre o panorama físico e humano da região conflituosa. Uma densa e definitiva análise sobre o camponês nordestino, as populações campesinas e sua lancinante relação telúrica com a dura e paradoxal realidade da terra nativa.

    Passada a cruenta refrega da qual, felizmente, saíra totalmente ileso, coligiu João Lelis, anos depois e refletidamente, sem artifícios surrealistas,

    com a autoridade de personagem e testemunha ocular, o exato e completo relato da memorável conflagração intestinal, no célebre “A Campanha de Princesa”, um compêndio verdadeiramente atual e espetacular, necessário à perfeita compreensão dessa rara história de talento e heroísmo.


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