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  • Depoimento de Argemiro

    30/03/2014

     Esta data, este o assunto. Alusivos à “Revolução de Março”? Guardo a memória do dia e do período em que aconteceram. No dia estava na Faculdade de Direito do Recife, concluinte do curso; no período vivia os entreveros da disputa Mariz x Gadelhas em Sousa. Algumas prisões escolhidas, por questões locais. Espetacularmente, nós tidos “de esquerda” ficamos no governo, e os Gadelhas tidos “de direita” foram jogados na oposição. Obra de João Agripino. O “Golpe” foi deixado para trás. Me-mória, memórias, quantas! Desculpem-me o introito impossível de es-quecer hoje. Valeu mesmo o alpendre, a rede, a preguiçosa, o patrão, o vaqueiro, o trabalhador do eito. Mas, tratemos do grande Argemiro de Figueiredo.
    Pois bem, aqui compareço, atendendo convite da preclara e no-bilíssima dama campinense Elizabeth Marinheiro − senhora da literatura e da sua teoria −, sobrinha de Argemiro Figueiredo, o homenageado, e prima entre outros, dos inesquecíveis e muito famosos amigos meus o beletrista Virgínius da Gama e Melo e o jurista Vital do Rego (Tonito para os íntimos), igualmente sobrinhos de Argemiro. Alegra-me a oportunidade de apresentar-me neste plenário, muito significativa para mim, entre as honras recebidas, a esta altura da minha vida. A presença ética, política e social de Argemiro Figueiredo na Paraíba, faz-nos sentirmos destacados entre outros Estados brasileiros.
    Argemiro Figueiredo − A Paraíba

    Ainda hoje, tendo em vista os recursos financeiros, modernas téc-nicas de urbanização e ambientação, disponíveis, Argemiro de Figueiredo , é considerado o administrador público que realizou as obras que embelezam e constituem ícones da nossa capital: A Lagoa do Parque So-lon de Lucena e o edifício do Liceu Paraibano, entre outras. E tem muito mais, relacionado com a crônica política do país: Argemiro deputado estadual, atuante em TRINTA, federal, senador duas vezes e governador duas vezes, uma como Interventor. Consolidada estava a sua imagem de político e de administrador. Sublimada, engrandecida está a sua memória.
    Filho de uma das mais tradicionais famílias campinenses, respeitada pela fortuna em propriedades e brilho intelectual, assumiu posições condizentes com a evolução política do país no surgimento de partidos e grupos políticos representativos dessa modernização. Independente liderou facções da opinião pública exerceu mandatos outorgados pela sua cidade,
    A Paraíba sempre deverá à Campina Grande mais do que pensa. E a Argemiro principalmente. A Paraíba nas décadas de Trinta, Quarenta e Cinquenta do século passado, considerada a maior produtora e exportadora de algodão em pluma para o resto do mundo, recebeu do eminente campinense atenção para esta atividade produtiva que gerava emprego e riqueza no Estado. Em legislação editada por ele tratou do zoneamento do plantio do algodão, conforme a variedade das sementes apropriadas para cada área com vista à produtividade e comprimento da fibra. E não ficou por aí. Protestou contra a invasão do Campus da Universidade de Brasília por militares armados, a prisão e coação de mestres e alunos no exercício da cátedra, nos fóruns de debates. Debateu e discutiu a SUDENE, no intuito fortalecê-la dada a sua vulnerabilidade de estrutura e de projetos. A decadência do modelo a destruiu. Um Varão de Plutarco.
    Argemiro Figueiredo - Campina Grande
    Depois das eruditas e patrióticas considerações sobre este evento, acredito nada mais seria necessário dizer. Tentarei, entretanto, uma breve digressão, que não ofende a memória de Argemiro Figueiredo, pelo contrário, exalta-o porque louva a sua terra, o seu povo. 
    Campina Grande tem para mim um significado profundo, inusi-tado para alguns, mas formador de um dominante estado de minha consciência. Vou ser franco: em Sousa nasci para a vida mas Campina me mostrou o mundo. Sou mais campinense roxo do que Agnelo Amorim e Cleidson Tejo. Quando chego lá eu sinto. Estou em casa. Seria influência do grandiloquente limeiriano Orlando Tejo, dos imortais Deodato Borges e Ronaldo Cunha Lima, de Eduardo Ramires, das cal-çadas da Maciel Pinheiro nos anos Cinqüenta ─ o lazer da época ─ ou “campinismo” mesmo, como zombam os despeitados do litoral? 
    Entre outras cidades, considero Campina maior e melhor, dada a sua localização histórico-geográfica num vasto mundo novo que não ignora as conquistas do mundo velho; privilegiada pela sua população contemplada com o tempero de origens em todos os continentes, hones-tamente, humanamente vivenciadas; possuidora de nomeada na ex-pressão dos seus heróis do trabalho, dos seus artífices e filósofos cons-trutores dos monumentos do conhecimento humano, feitos de pedra e de idéias. Pouco? Aí a humanidade está por inteiro, na presença e na visão cultural do bacharel Argemiro Figueiredo que bebeu a sua ciência e ilustrou a sua inteligência na tradicional Faculdade de Direito do Recife, fundada no Iluminismo que construiu novas linhas do pensamento uni-versal. Toda vida social conhecida abriga-se nessas condições circuns-tanciais, nessas teses evidenciadas. É a Campina de Argemiro que se ergue, distanciando-se inalcançável, inimitável.
    Passado algum tempo sempre volto a Campina onde fui aluno do colégio de Padre Emídio, o lembrado Pio XI dos anos de ouro da Rainha da Borborema. Argemiro está presente por onde ando. Não volto para o impossível reencontro boêmio, mas tangido pela saudade, para reviver nomes. Cito o poliglota Oinotna Sevla Searom (anagrama de Antonio Alves Moraes, ─ como ele gostava e se assinava) garçom do “Ponto Chic”, que falava, escrevia, lia e traduzia, alemão, espanhol, inglês, francês, latim, italiano, grego, também esperanto e tupi, que patrio-ticamente lecionava de graça (tudo aprendido em Campina), sem atentar para a tragédia pessoal do amanuense Policarpo Quaresma que sofreu e desapareceu nos desvãos do destino e de uma vida como a sua. 
    O atinado Gonzaga Rodrigues, seu colega de quarto em Campina, que ouvi declamar em língua tupi, numa mesa do Café São Braz, os versos de Gonçalves Dias “Minha terra tem palmeiras onde canta o sabiá...” vertidos para o idioma índio pelo comentado bardo, traçou-me aspectos da imagem deste poeta. Oinotna era assim. Ele tipifica Campina na auto realização do seu mito, imortal como a Hidra mitológica. Não dá para falar isoladamente de pessoas, na construção das imagens simbólicas que Campina propiciou, numa caracterização do sonho grego de uma civilização universal que se tornou única e insuperável. Tratemos de famílias e de tipos, de indústrias, no sentido de destreza, engenho e arte, que notabilizaram os seus cientistas-artesãos. Campina Grande fabricou um tanque de guerra e revólveres Smith&Wesson. Todos sabem. 
    Conhecemos e admiramos os Lauritzen, Figueiredo, Almeida, Cabral, Gaudêncio, Habib, Chabo, Procópio, Luna, Tejo, Caroca, Cunha Lima, Asfora, Barreto, Rique, Amorim, Celino, Mota, Agra, do Ó, Hamad, Wanderley, Dantas, Rego, Pinto, Soares, Afonso Campos, e outros e outros, e os tipos e as personalidades inconfundíveis de Ataliba Arruda, Otávio Amorim, Pinta Cega, Mário Araújo, Zeca Chabo, Zefa Tributino, Nathanael Belo, Moacir Tié, Paizinho, Dona Irene, Fausto Alfaiate, Maciel Malheiro, Oliveiros Oliveira, Soares, Seu Muniz, Moço Amorim, Antonio Bioca, Nereu do Cartório, Giseuda Moreira, dr. Zé Arruda e Manoel Pé de Rotor, o impertérrito e culto deputado e torcedor de futebol Orlando Almeida, as rádio Cariri, Borborema e Caturité e tan-tos e tantos. Ah! Imperdoáveis omissões. No tocante à ideologias e pro-selitismo, tivemos o comunista Peba que nunca esteve em Moscou em oposição a um empresário capitalista Barreto, que falava inglês e morou nos Estados Unidos.
    Tudo condiz com a nobreza familiar, a grandeza cívica de Arge-miro Figueiredo, a legenda de Campina Grande. A sua participação engrandece o fato. Assim, em razão do racha da UDN, rompeu com João Agripino e estruturou o PTB no nosso Estado, a que entre outras se integrou a minha família, por recomendação do meu tio então senador Salviano Leite, que fora seu colega de turma na Faculdade de Direito do Recife e guardavam forte e recíproca amizade. 
    Finalizo referindo o feito de Campina, como sempre marcante, pi-oneiro na transformação da arquitetura urbana das nossas cidades, que se orgulhavam dos seus sobrados coloniais vetustos com ornamentos clás-sicos e barrocos, mas desconheciam o progresso que ganhava os céus com a construção dos grandes edifícios, de muitos andares. Nesse campo, Campina mostrou o futuro à Paraíba, construiu o edifício para fun-cionamento do “Grande Hotel”, um mito aventuroso e romântico no mundo inteiro, na primeira metade do século passado, animando a vida empresarial e social dos esnobes daquele tempo.


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