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  • 30.04.2014 - 18:30

    Livro digital é usado contra analfabetismo em países pobres


     Guilherme Tagiaroli/uol

    Ter acesso a livros físicos é quase impossível em lugares como a África subsaariana em função de conflitos étnicos, políticos e militares. Os números relacionados à educação naquela área são desanimadores: apenas 18% das crianças recebem educação básica, segundo a Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura).  No entanto, o uso da tecnologia tem ajudado a amenizar os baixos índices de analfabetismo na região e em outros países pobres.

    Uma das organizações que trabalham com isso é a Worldreader. Ela atua de duas formas: disponibilizando leitores eletrônicos para escolas de países africanos e por meio de um aplicativo chamado Worldreader Mobile. Esse programa pode ser instalado em celulares simples (desde que eles tenham um navegador Java) e dispositivos Android.

    Fundada em 2009 por ex-diretores da Microsoft e da Amazon, a instituição atua principalmente em países africanos. "Tentamos disponibilizar conteúdo digital onde, historicamente, os livros nunca chegam", afirmou Susan Moody, diretora de desenvolvimento e marketing da Worldreader.

    Reprodução

    Imagem do aplicativo Worldreader para o Android

     

    Os títulos vão desde livros africanos a guias práticos para uma vida saudável. Há ainda clássicos, como os escritos por William Shakespeare e Jane Austen, além de histórias curtas para pessoas em processo de alfabetização e livros didáticos. Esse conteúdo pode ser baixado em redes de baixa velocidade (2G) graças a uma tecnologia de compressão de dados.

    Em conversa com o UOL por telefone, Susan explicou o funcionamento do aplicativo, o surgimento da organização e o desafio de erradicar o analfabetismo no mundo. Veja abaixo os principais trechos:

    UOL Tecnologia: Como surgiu a Worldreader?

    Susan Moody: Somos uma organização sem fins lucrativos e vimos uma oportunidade para lutar contra o analfabetismo ao notar o crescimento de três grandes tendências tecnológicas: crescimento do acesso à telefonia móvel, aumento da cobertura de internet móvel e a popularização de livros digitais.

    Decidimos tentar disponibilizar conteúdo digital onde, historicamente, os livros nunca chegam.Fazemos isso de duas formas: distribuindo leitores eletrônicos Kindle em algumas escolas e por meio de um aplicativo para celulares simples e dispositivos Android. 

    UOL Tecnologia: Qual critério vocês utilizam para atender a determinadas localidades?

    Susan: O primeiro critério é chegar a locais onde não há acesso a livros. Há lugares onde há um livro para cada 78 crianças.

    Levamos em consideração também nossas parcerias. Algumas fundações já realizam outros tipos de trabalhos nessas localidades e isso facilita nosso acesso.

    Temos conteúdos em inglês, francês, espanhol e português. Há também um esforço de contatar editoras locais para disponibilizar esses conteúdos nas línguas de cada país, como suaíli --falado no Quênia e na Tanzânia.

    A demanda é imensa, pois os livros na região são escassos. Para a gente é importante conseguir dinheiro para poder licenciar mais títulos e achar parceiros estratégicos para implementar nossos projetos.

    Jon McComarck/Divulgação/Worldreader

    Worldreader doa leitores digitais Kindle, da Amazon, para escolas africanas

     

    UOL Tecnologia: Como vocês se mantêm?

    Susan: Recebemos dinheiro de três fontes. Há pessoas físicas, governos [trabalhamos com a Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento, por exemplo] e instituições. Uma delas é a Fundação Bill e Melinda Gates [instituição de caridade comandada por Bill Gates, cofundador da Microsoft, e sua mulher]. É possível fazer doações via cartão de crédito em nosso site ou via PayPal.

    UOL Tecnologia: O objetivo da organização é atingir apenas as crianças?

    Susan: Sabemos que e-readers funcionam bem com crianças, pois é uma idade crucial para elas aprenderem a ler. O foco é tentar fomentar a leitura nos mais novos.

    Porém, o aplicativo tem tido sucesso, pois pode atingir a todos [desde que tenham um telefone celular]. As pessoas utilizam o programa para continuar seus processos de educação, aprendendo e crescendo com a leitura.

    Jon McCormack/Divulgação/Worldreader

    Segundo Unesco, celulares têm ajudado na luta contra o analfabetismo

     

    UOL Tecnologia: Como essas pessoas tomam conhecimento do aplicativo desenvolvido por vocês?

    Susan: Trabalhamos com alguns parceiros que, eventualmente, disponibilizam nosso aplicativo já pré-instalado no aparelho.

    Uma vez que um leitor descobre, eles costumam amar. Algumas pessoas nos EUA dizem não entender como tem gente que lê numa tela pequena. No entanto, em países em desenvolvimento têm ocorrido o oposto. Fizemos uma pesquisa recente com a Unesco, e eles entrevistaram pessoas sobre seus hábitos de leitura. Cerca de 60% disseram que gostam de ler em celulares e que gostariam de ler mais. Isso só nos animou mais ainda.

    UOL Tecnologia: Vocês têm noção de quantas pessoas já se beneficiaram das ações da Worldreader?

    Susan: Contabilizamos 1,7 milhão de livros que foram lidos – uma marca que seria bem difícil alcançar com edições físicas. Em nosso aplicativo, temos mensalmente 200 mil leitores ativos em aparelhos simples e em dispositivos Android.

    UOL Tecnologia: Quais são os próximos planos da Worldreader? Há planos para fazer projetos como esses realizados na África na América do Sul?

    Susan: Queremos atingir de forma significativa todos os países possíveis. É um problema conseguir investimento para atender a essa grande demanda [de pessoas que não têm acesso a livros]. Queremos chegar o mais longe possível, não importa se pela disponibilização de leitores eletrônicos ou por meio de nosso aplicativo para celulares básicos.