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  • Jantando com o Marechal

    27/08/2013

    Já se escreveu que qualquer democracia, mesmo ruim, é melhor que uma ditadura boa, se é que esta existe. Nos primeiros anos pós 64, muita gente ainda acreditava nos propósitos democráticos da “redentora” que afastara Jango para impedir “ o avanço dos comunas”. Depois veio o AI-5 e com ele o atropelo à Constituição de 1967, votada por um Congresso limitado em seus poderes e convocado especialmente para aquela finalidade. E quando se pensava que as coisas poderiam melhorar, surge a Carta de 1969, esta, um simples emenda outorgada por uma Junta Militar, à qual Ulisses Guimarães, em momento de justificada ira, denominou de “Os Três Patetas”.
    O marechal Costa e Silva tomou posse no mesmo dia em que começava a vigorar uma Nova Constituição. Era de se esperar que esse fato fizesse nascer um raio de esperança em quem acreditou nas boas intenções iniciais do movimento militar. Castelo Branco, o primeiro de uma série de generais na presidência, nomeou uma comissão de juristas para elaborar o Projeto de Constituição. Ao recebê-lo, proclamou que aquele era um presente ao povo brasileiro, um “ato magno do meu governo” para o qual prometia a “respeitabilidade merecida”.
    Dentro desse clima de crença em um futuro menos obscuro, os estudantes concluintes da Faculdade de Direito da UFPB, naquele longínquo ano de 1967 do século passado, escolheram o presidente-marechal como paraninfo da turma. O capitão-reitor queria mais. Para trazer o presidente à Paraíba era preciso que fosse ele o paraninfo geral de todas as turmas. E assim foi feito que ninguém era doido para discordar.Quem discrepou, se fez ausente à colação de grau, em protesto silencioso.
    Os concluintes de direito foram agraciados com uma excursão a Porto Alegre, Rio e Brasília, em um avião da Presidência da República. Hoje as coisas mudaram, e essas aeronaves ficam sob censura, até quando fazem inocentes périplos por festas de casamento ou arenas futebolísticas. Naquele tempo, tudo podia, pois “a revolução é, e continuará”.
    O presidente veio paraninfar seus pupilos, eu entre eles. O cerimonial reservou na mesa do jantar, servido na casa do general comandante da Guarnição, cadeiras para dois afilhados presidenciais. Além do orador que vos fala, o saudoso colega Antonio Eiman Pessoa. Sentei-me de frente para o Presidente e para o Governador. Imaginem! Fiquei tão intimidado e nervoso que é impossível revelar o cardápio. Nem lembro se comi... O vinho eu sei que tomei!
    Mas lembro de uma conversa interessante que vou contar para encerrar o assunto. Durante o jantar, chega o deputado Ernani Satyro, líder do Governo. O presidente Costa e Silva vira-se para o governador João Agripino e revela:
    - O Ernani é seu grande defensor. Dependesse dele, você teria sido o meu vice-presidente. Mas ainda pode ser no futuro, até presidente...
    Agripino rebateu:
    -Presidente, quando eu sair do governo não mais disputarei cargo eletivo. Se houver oportunidade, no futuro, e me for oferecido, eu aceitaria uma vaga de ministro do Tribunal de Contas.
    Alguns anos depois, Agripino era nomeado ministro do TCU e ocuparia com raro brilho a sua presidência.
    PS. Agripino, cujo centenário de nascimento ocorre ano que vem, ainda voltou ao Congresso como deputado.
     


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