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  • 01.08.2015 - 06:01

    Paquistanês cruza 8.300 km, por sete países e pede asilo


    DEPOIMENTO A

    LEANDRO COLON
    ENVIADO ESPECIAL A CALAIS (FRANÇA)

     Inayat Hussain, 18, está há dois meses em Calais, na França. Viajou mais de um mês, atravessando sete países, incluindo o seu, o Paquistão, até chegar à região norte francesa. Ele pediu asilo para ficar no país.

    *

    Nasci e cresci em Parachinar, capital de Kurram Agency, no noroeste do Paquistão, uma área que faz fronteira com o Afeganistão.

    É uma região tribal marcada por diversos conflitos religiosos, com registro de atentados, sem nenhuma perspectiva de vida e futuro para um jovem como eu.

    Com medo, meus pais decidiram vender a casa e viver numa espécie de floresta, na mata mesmo. Parte do dinheiro me deram para ajudar na minha tentativa de chegar à Europa -meu destino final era a França.

    Levei 12 dias, a maioria a pé e parte de carona, até Teerã, no Irã.

    De lá, passei um dia caminhando e outro de carro até Istambul, na Turquia. A próxima parada era a Bulgária. Foram mais 15 dias de caminhada, dormindo em bancos de estações de trem, na rua, pedindo comida.

    Em Sófia [capital búlgara], fui pego pela polícia. Lá, eles tratam como criminosos as pessoas como nós, que tentam chegar à Europa para uma vida melhor.

    Eles acabaram me prendendo e fizeram os registros das minhas digitais. Apanhei demais, levei muitos socos na cabeça. Queriam me matar, tenho certeza.

    Passei 20 dias preso num cubículo, comendo metade de um pão por dia e bebendo um pouco de água.

    Apanhei mais ainda. Eu não havia feito nada de errado, só estava tentando seguir minha viagem.

    Me soltaram, quis deixar logo aquele país e fui para a mata para tentar chegar à Hungria, passando pela Sérvia. Também fiz a maior parte desse trecho da viagem a pé. Não lembro muito das cidades. O dinheiro era pouco, e não sabia até onde iria.

    Da Hungria, segui para Milão, na Itália. Ali ficou mais fácil: era só pegar um trem, passando por Nice [já na França], até Calais.

    Vivo numa barraca dentro dos acampamentos que os imigrantes passaram a chamar de "jungles".

    Certamente não é o melhor lugar do mundo, mas pelo menos tem uma assistência, com água, comida e ajuda médica.

    A maioria aqui quer tentar chegar à Inglaterra. Eu também já tive essa vontade -até tentei, fui barrado e desisti porque não quero ser preso de novo.

    Um amigo meu paquistanês morreu recentemente tentando fazer isso.

    Decidi pedir asilo ao governo francês, pois não posso voltar para o Paquistão. Tive problemas no começo do processo por causa do meu registro de prisão na Bulgária -descobriram pelas digitais que tinham tirado.

    Mas consegui uma declaração de domicílio aqui em Calais da associação que nos ajuda e que também é parceira da prefeitura.

    Esse papel é importante porque mostra onde estou e como o governo pode me encontrar.

    Nesta sexta (31), levei a documentação e me chamaram para voltar na segunda (3), para coletar as digitais do processo. Estou muito feliz.