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  • Ano zero, vida nova

    19/08/2015

     As minhas viagens são curtas, a despesa é pequena, o cansaço menor, e como me alegram! A minha mulher pessoa daqui, exclama, sopra baixinho também surpresas e alegrias. Às vezes toca no meu ombro e aponta numa direção. Nos sentimos bem, no conforto da camionete e quando nos sentamos para conversar, matar a sede com uma mineral gelada, numa breve parada na estrada para olhar uma roça, uma laje curiosa, árvores, grotas profundas, a paisagem vista de cima da serra.
    Devo uma explicação sobre a minha vida antes da mudança de residência da cidade para a fazenda, do descarte do cerimonialismo da política. Coisa de saudade, de nostalgia, fruto de comentário encontrado alhures sobre o recolhimento dos generais romanos à vida campesina, extra-muros, no regresso das guerras do imbatível Império onde o sol não desaparecia no horizonte no mundo antigo. Uma espécie de lazer campestre, um prêmio ontem e hoje. 
    Combati o meu combate. Não como um general, mas nas fileiras. Disciplinado nem tanto, ganhei, todavia, o meu repouso remunerado. E também a satisfação pessoal de me voltar mais para o meu pequeno mundo, e para mim mesmo, nas minhas pequenas escapadas e visitas a este pedaço de sertão, nos elucidativos diálogos com os habitantes do lugar. 
    Triunfo é uma cidade que está crescendo mais do que as outras. Esta afirmação explica a cozinha moderna dos bares e lanchonetes, a decoração ambiente comprada em pacotes pela iternet e aplicada por jovens que se profissionalizaram, nascidos ali mesmo. Um fenômeno a ser pesquisado, debatido, conhecido e explicado. Vocação local para as tarefas da cultura e do desenvolvimento. Atuação do governo na aplicação de programas específicos voltados para o desenvolvimento e integrativos da cidadania.
    Na verdade, em cada rua topo monumentos votivos, comemorativos, estátuas gigantes diria em trajes bíblicos, de operários, artesãos, de santos. O anúncio de seminários e conclaves culturais programados, é difícil acreditar verdadeiros no fim do mundo, na última cidade do Estado. Induz a presença de forasteiros, peregrinos vidrados na arte nos eventos culturais. O Ceará está pertinho, dá pra escutar os ecos de lá. 
    Difícil mesmo, é encontrar o passado no centro de Triunfo. Mas nas imediações, numa casa antiga, no cochilo de um velho deparamos a tradição, que deu nascimento ao hoje que prenuncia o futuro. Porque as encenações e reuniões que falam resgatar o que se perdeu no tempo, apesar da riqueza de possibilidades deslustram o típico, resta o moderno, que exibe, entretanto, a sua significação militante.
    A leitura, que desde a meninice, tornara-se para mim um hábito copiado dos livros e dos jornais do meu pai, das revistas de minha mãe, que, eventualmente eu folheava, me socorre nas indecisões. Acredito que as novas gerações daqui gostam de livros.
    Fazer ou não fazer? Dizer ou não dizer? Eis a questão. Na minha casa e na de parentes tinha rádio e vitrola, um luxo na época. Minha mãe e minhas irmãs, as empregadas e as visitas cantarolavam. O clima de projetos e gastos era permanente. Era a medida da vida, do tempo, do recolhimento ou da comemoração. 
    Cheguei em Triunfo ainda encantado com a igreja, as beatas e a industria leiteira de Santa Helena, mas a cidade parecia ter parado no tempo. Mesmo assim as pessoas se aproximavam, conversavam não desconfiadas mas reticentes com gente de fora. Tracei o meu roteiro: Barra do Juá, Santarém, Bernardino Batista e Uirauna. Dali o meu regresso para casa.
    Esclareço o que me satisfaz neste mundo atrasado, como reclamam familiares e amigos. Tudo bem. Nasci entre os privilegiados socialmente, e de quanto vivi guardo boas lembranças, misturadas, evidentemente com dificuldades e dores. Quem não as sofreu? Aqui respiro fundo e encho os pulmões de oxigênio puro que se espalha pelo meu corpo, deixando uma sensação de bem estar, na ilusão de ganhar mais dias de vida. Assim recomenda a midia, ensina a TV. Nada melhor no trânsito a vida. Mas bate o receio mais cruel do que da riqueza perdida. O efêmero que domina os fatos da vida é avassalador. 
    A hora chegará. E agora?


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