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  • Maconha no Róger

    03/01/2014

     A história que vou contar agora tinha uma única testemunha – que faleceu. Significa que se eu mesmo não contar, ninguém poderá fazê-lo.
    Aconteceu no Presídio do Róger, em 1991. Como Secretário de Justiça e Cidadania, adotei como norte do meu trabalho no sistema prisional aquele conhecido lema de Che Guevara: ser duro, mas sem perder a ternura. 
    O estabelecimento prisional em causa era um caldeirão prestes a explodir, sobretudo pela superlotação. Determinei o fim da tortura e exigi disciplina dos presos. Andava leve e solto no meio deles. Nomeei diretor o Coronel PM Afonso, de saudosa memória, um simpático militar que tinha autoridade sem ser autoritário.
    Tomei conhecimento de que havia muitas armas nas celas (estiletes, serras, escovas dentais com a ponta afiada etc.). Chamei o Coronel Afonso e determinei uma operação pente fino, secreta, para depois de meia noite. Comuniquei o fato ao juiz da Execução Penal, que fez questão de acompanhar o procedimento. A imprensa estava presente.
    Chegada a hora, fiz as recomendações de praxe ao Diretor. A ordem era apreender armas e drogas. O juiz lembrou que devia haver muita maconha nos cubículos. Terminada a preleção, chamei o Coronel em particular e fiz uma ponderação:
    - Coronel, mande a tropa apreender armas e drogas pesadas, mas deixe a maconha dos presos em paz.
    - Mas como, Secretário? O juiz disse...
    Aí eu exagerei nas minhas atribuições:
    - O juiz cuida dos processos judiciais e eu da administração penitenciária. Outra coisa, Coronel, nós temos até vinte presos ocupando o espaço de seis nas celas deste inferno. Se ainda não tivemos um motim, deve ser justamente por causa da maconha, que acalma e dá um sono danado.
    A operação foi bem sucedida, a maioria dos presos a aprovou e muitas armas foram recolhidas. No meu período como Secretário, não houve um único motim no sistema prisional. Não estou dizendo que foi por causa da maconha...


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