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  • A morte de Antônio

    12/12/2013

    Antônio Pordeus Mariz era uma figura muito popular em Sousa e por diferentes razões. A principal delas era pelo fato de ser um homem muito prestativo. Trabalhava na Prefeitura Municipal de Sousa, que abrigava o único Posto Telefônico da cidade. Frequentemente recebia ligações de parentes que moravam fora e queriam fazer contato com a família, sobretudo de São Paulo (SP). Antônio marcava hora, fazia os contatos e deixava todos felizes. Também trabalhou na Maternidade, onde fez muitos favores.

    Era de tal forma querido pelos conterrâneos que nas datas especiais recebia presentes os mais variados. Galinha, queijo de manteiga, rapadura, doces caseiros e outros mimos. Certo dia uma notícia triste correu os quatro cantos da cidade: a morte de Antônio. A cidade quase parou, perplexa e desolada. O falecido devia ter menos de 40 anos e morrera repentinamente. A causa, provável, era infarto.

    E chegou a hora do enterro. Uma multidão acompanhara o caixão pelas ruas da cidade, na Igreja e a caminho do Cemitério, sem falar nas pessoas que ficavam nas calçadas de suas casas para reverenciar o extinto e talvez rezar por sua alma. Nas imediações da Usina de Luis Oliveira, por exemplo, depois do Beco do Açougue, ainda hoje é comum as famílias ficarem sentadas nas calçadas altas assistindo a passagem de defuntos a caminha da última morada.

    No Cemitério, antes do caixão descer à sepultura, alguém teve a ideia de abri-lo para o último adeus ao prestigiado Antônio. Quando a tampa foi aberta, eis que o ‘defunto’ abriu os olhos e, mais que espantado, falou:
    - Onde estou? O que está acontecendo?

    Foi o suficiente para a multidão partir em desabalada carreira, passando por cima de covas, atropelando cruzes e promovendo uma ensurdecedora gritaria. “Um fantasma”, diziam alguns. “Isso é coisa do outro mundo”, falavam outros. A cena que se viu em seguida era essa: a procissão que seguiu para o Cemitério em passos cadenciados, agora voltava na carreira em sentido contrário; as pessoas que estavam nas calçadas se trancavam em suas casas, sem nada entender; e o ex-defunto, de mortalha, corria atrás da multidão, mas não conseguia falar com ninguém para saber o que danado estava ocorrendo.

    A partir desse dia, Antônio viu seu sobrenome ser substituído pela palavra Morreu. Ele ficava furioso quando o chamavam de Antônio Morreu. Dava azar, dizia ele, e trazia más lembranças. Na verdade, Antônio teve um ataque de catalepsia, cujos sintomas aparentes se confundem com a morte. Solteiro, ou “rapaz velho”, como se dizia na época, baixinho e com a cabeça precocemente branca, esse personagem que ficou na história de Sousa por ter morrido ‘duas vezes’, era irmão de Dona Noêmi, esposa do ex-prefeito Tosinho Gadelha. Sua morte de verdade aconteceria anos depois.

    Hipocrisia


    Se o mundo que se uniu ao redor de Nelson Mandela morto, tivesse feito o mesmo quando ele era vivo, o líder sul-africano não teria passado 27 anos na cadeia pelo ridículo crime de opinião na sua luta pela igualdade, pela paz e contra a intolerância racial.


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