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  • A união Mariz-Marcondes

    26/11/2019

    Opositor de Mariz na eleição para o Senado em 90 e adversário histórico em Sousa, o ex-senador Marcondes Gadelha vinha concedendo entrevistas seguidas à imprensa afirmando que não votaria em Lúcia para o governo, em 1994. Era uma desforra contra a posição dela na eleição anterior de renegar a candidatura de Gadelha. Fui chamado por Mariz para conversar sobre essa posição de seu adversário histórico. Mariz fez um raciocínio lógico.

    Se Marcondes não votava em Lúcia, estava subentendido que votaria nele, pois ambos eram os únicos candidatos competitivos. E me propôs que procurasse o suposto dissidente para uma conversa, o mais rápido possível, e procurasse sentir se era realmente essa a disposição de Gadelha. “

    - Logo eu, Mariz, o mais radical adversário dos Gadelha, reagi.
    - Justamente por isso tem que ser você, pois os menos radicais não vão poder censurar nossa união com Marcondes, ponderou.

    Agi rápido. Sem interlocução naquele instante com os irmãos de Marcondes, mandei uma proposta de encontro com ele através de Francisco Fontes Gadelha, o Júnior Bigodinho, a quem pedi reserva absoluta. O encontro foi marcado na sua casa de praia do Bessa, em João Pessoa, e ficou acertado que a conversa não teria testemunha, por razões óbvias.

    Cheguei à casa de Gadelha pontualmente às 7 horas de uma manhã ensolarada. Ficamos na piscina e o mar, bem à nossa frente, produzia ondas barulhentas, impedindo o funcionamento de um eventual gravador ou mesmo um ouvido curioso. Fiz uma breve introdução, manifestando o desejo de Mariz de receber seu apoio em nome da união de Sousa e estava ali para levar a ideia adiante, se fosse o caso. Ele disse que não votaria em Lúcia para o governo e tinha esse direito pelo fato de Lúcia ter sido responsável pela derrota que sofrera para o Senado em 90.

    Discorreu sobre sua trajetória política e disse que pagou um alto preço pela troca que fez do PMDB pelo PDS. Lembrou que ele e Mariz haviam amargado uma dura derrota para governador em Sousa (82 e 86), sendo aquela uma oportunidade de ser eleito um governador sousense. Daqui a quantos anos a cidade teria outra chance, indagou. Portanto, estava disposto a votar em Mariz e celebrar o até então impensável acordo Mariz-Gadelha. Propus, como consequência concreta do encontro, uma conversa entre ambos em Brasília, o que veio a ocorrer dois dias depois, com a presença do presidente do PMDB, Humberto Lucena, como queria Mariz.

    Voltei a Mariz e disse que Marcondes estava disposto a apoiá-lo. E que tinha acertado o encontro em Brasília, recebendo sua aprovação. Até aquele momento, a imprensa de nada sabia. Quando começaram a sair as primeiras informações sobre essa inusitada operação política, o mundo pareceu desabar sobre as cabeças das duas bandas da política de Sousa. Marizistas e gadelhistas reagiram mal ao acordo, pelo menos no primeiro momento.

    Cartazes dos dois líderes, guardados de outras campanhas, foram rasgados em praça pública. Passado o impacto, as vozes foram se acalmando, cabeças esfriando e a razão prevaleceu. Sousa estava unida, ainda que não totalmente, mas majoritariamente unida. Essa união tinha um sentido pedagógico. É que outros grupos dissidentes do esquema braguista de diversos municípios queriam votar em Mariz, mas os aliados locais vetavam.

    Ora, se Mariz se unira a Gadelha, com qual argumento esse veto poderia ser oposto? Por outra, não é plausível a um candidato recusar apoio político e voto, senão quando há prejuízo eleitoral à vista. Mais: alguns candidatos a deputado (estadual e federal) aliados de Mariz eram votados também por prefeitos eleitores de Lúcia Braga. Essa salada é inevitável.

    Entretanto, o único problema de Mariz não era fazer as costuras políticas, apartar brigas paroquiais e atrair dissidentes para superar Lúcia nas pesquisas. O grande desafio dele era ter resistência física para chegar no final da campanha inteiro. Ou vivo. Tomando remédios à base de corticoide para a cura do câncer, o heroico candidato avançava sobre a adversária com bravura e obstinação.

    Queria vencer. Precisava ganhar. Faltava-lhe a respiração? Sobrava-lhe coragem. Contra a escassez da força física, o excesso de vigor espiritual. Era uma luta dupla pela vitória nas urnas e pela vida.

    Sempre que se afastava da campanha para fazer tratamento à base de quimioterapia, os desesperados adversários espalhavam o boato macabro da morte de Mariz. Certa vez ele me disse que contra essa maldade não havia outra coisa a fazer, a não ser mostrar a cara nas ruas e na televisão. “É inacreditável, mas eu preciso provar que estou vivo”. Surrealismo puro.

    Registro P.S.: Vitorioso nas urnas e no sonho de governar a Paraíba, Mariz nos deixou no dia 16 de setembro de 1995, às 18 horas e 58 minutos, na residência oficial, a Granja Santana. Parece que foi ontem, mas já se passaram 24 anos. Anos de grande saudade e lembrança eterna. 


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