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  • Um primogênito chamado Satã

    25/04/2018

     Naquele tempo encantado das conversas de calçada da casa de minha avó ouvi muitas histórias fantásticas. Uma delas foi sobre um escritor das Espinharas que na época do Estado Novo ficou vários meses escondido no pico do Jabre para não ser preso por causa da publicação do seu livro "As Bases do Separatismo".

    Na plaqueta O Louro do Jabre escrevi: "A proposta  do livro de Allyrio era dividir o Brasil em cinco grandes nações. Nesse período sofreu grande perseguição do governo.  Escondeu-se no mato. A parentela construiu no sopé da serra do Teixeira uma casa de pedra para lhe dar guarida.  De lá o exilado avistava o pico do Jabre, o mais alto da província da Parahyba do Norte. Determinadas noites saía do esconderijo e vinha a cidade de Patos conversar com o seu amigo de infância, o padre Fernando Gomes que mais tarde foi bispo de Penedo em Alagoas e depois Arcebispo de Goiana.

    Nessa época estava casado com a alemã Augusta Herta Cleneveth Wanderley. Numa dessas noite disse ao padre e amigo que iria colocar o nome do primogênito de Satã. Fernando ficou indignado e o repreendeu veementemente.  O menino terminou registrado com o nome de José Jabre e afilhado do padre.  Na época, em virtude da publicação do livro, foi processado e tempos depois  absolvido por unanimidade". Moleque, eu ouvia tudo atentamente sem dar uma palavra. Aquela calçada que aguardava toda noite o Aracati, guarda histórias do "tempo do ronca".

    Um compadre da minha avó também contou que Allyrio era um gênio: Numa roda de amigos provava que Deus não existia e deixava todos calados, em outra provava que Deus existia e deixava os cristãos satisfeitos e convencidos.  Foi depois dessas conversas da calçada da casa da minha avó que me interessei pela obra esgotada do maior escritor da morada do sol. Passei mais de trinta anos procurando os seus livros, mas finalmente completei a coleção, inclusive suas traduções de Dostoiewski, Tolstoi e Leonid Andreiev.


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