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  • 28.08.2017 - 10:43

    MORTE DE DOM JOSÉ: governador Ricardo Coutinho exalta coragem de arcebispo


    O governador Ricardo Coutinho (PSB) expressou, ontem, em redes sociais, sua consternação com a morte de dom José Maria Pires, arcebispo emérito da Paraíba, destacando sua coragem nas lutas que encampou em defesa dos setores marginalizados da sociedade paraibana. Dom José faleceu ontem à noite num hospital em Belo Horizonte, Minas Gerais, aos 98 anos, vítima de problemas pulmonares. Por trinta anos esteve à frente da Arquidiocese da Paraíba. Veio de Minas Gerais em março de 1966, transferido da diocese de Araçuaí, ao norte do Estado, numa conjuntura especial quando terminou o Concílio Vaticano II, que introduziu profundas mudanças na Igreja Católica. Dom José participou ativamente daquele Concílio e era um dos responsáveis pela nova Igreja que então surgia. Em paralelo, instaurava-se no Brasil um regime militar a pretexto de defender a democracia e que se converteu em ditadura, com prisões e torturas de opositores e cerceamento das liberdades. Num primeiro momento, dom José apoiou a chamada revolução de 64, mas em pouco tempo se desiludiu com os rumos tomados e tornou-se uma das mais combativas vozes na contestação aos atos emanados da nova ordem.

    Ele encerrou sua missão na Paraíba em 1996, mas sempre fez questão de vir ao Estado em ocasiões marcantes, como recentemente, quando da morte de dom Marcelo Carvalheira, que foi seu bispo-auxiliar e, posteriormente, com sua aposentadoria, tornou-se arcebispo da Arquidiocese. Dom José era um dos poucos bispos negros da Igreja no Brasil e era tratado com “Dom Pelé” e “Dom Zumbi”. Filho de pais pobres, foi arcebispo aos 46 anos de idade e, confrontando com a realidade de pobreza na Paraíba não hesitou em tomar partido em prol dos trabalhadores e de categorias oprimidas. Esteve na linha de frente da denúncia e da resistência a proprietários rurais que espoliavam empregados nas fazendas da Paraíba. Organizou a Arquidiocese com as pastorais totalmente dirigidas para a promoção dos pobres e excluídos. Instituiu o primeiro Centro de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana no Brasil, confiado ao advogado Vanderley Caixe, que faleceu em Ribeirão Preto, São Paulo.

    Dom José era profundamente identificado com outros expoentes da chamada “linha progressista” do clero, numa época em que a Igreja dividiu-se entre progressistas e conservadores. Firmou uma conexão com dom Hélder Câmara, que ganhou notoriedade como arcebispo de Olinda e Recife, como mentor da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB e era taxado pelos militares de “bispo vermelho”. O professor Sampaio Geraldo Lopes Ribeiro, autor de livros sobre a trajetória de dom José, afirma que logo ao chegar à Paraíba o prelado despojou-se do Palácio, onde sempre moraram os arcebispos e manteve, durante todo o episcopado, um carro simples sem nenhum acessório de luxo a não ser um radio AM para notícias e futebol enquanto viajava. Ele mesmo dirigia o automóvel.

    – Em nenhum momento – assevera Sampaio Geraldo Lopes – dom José titubeou (frente às dificuldades e pressões sofridas). Não houve general, exército, telefonemas anônimos, ameaças, perseguições, que o fizessem hesitar um momento sequer. Era, justamente, aquela firmeza, que impedia que os militares fizessem qualquer coisa contra a pessoa do arcebispo da Paraíba ou contra os pobres da região – acrescenta. Agraciado com o título de Cidadão Paraibano pela Assembleia Legislativa, dom José recusou o pedido de deputados da Mesa Diretora para que lhes submetesse previamente o teor do discurso que pronunciaria. Recusou-se a fazê-lo, argumentando que não admitia ser censurado nas suas palavras e pensamentos. A solenidade não houve. Tempos depois, na redemocratização, ele foi novamente assediado para receber o título, com liberdade para se expressar. Agradeceu a deferência mas recusou a cerimônia. “Já sou paraibano, pela vontade do povo”. (OSGUEDES)