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  • O impagável contador de causos

    09/03/2014

     Era uma manhã de sábado de fevereiro ou março de 2007 e o meu celular acusa uma chamada não atendida (eu estava no banho). Retornei a ligação e logo reconheci a voz em tom forte, grave de Zeca. Queria saber onde eu ia almoçar.
    Só para recordar. 2006 talvez tenha sido o pior ano da minha vida. Havia perdido a reeleição de deputado federal, gastei cada centavo que tinha e o pior: saí devendo. E não tinha a menor ideia de como pagar as contas. Também não tinha bens para quitar as dívidas, pois na campanha vendi um pequeno apartamento e depois dela me desfiz de uma camioneta SW4.

    Portanto, economizar dinheiro, qualquer dinheiro, era uma regra na minha rotina. Fui com Zeca e a família almoçar no Carpe Diem, que serve uma das mais completas feijoadas de Brasília, pela metade do preço do Piantella. Para meu alívio, o nosso convidado resolveu tomar cachaça, normalmente mais barata.
    Para quem não conheceu o personagem, Zeca devia ter esse apelido porque sua boca era enorme. Quando ria, ia de orelha a orelha. Lembro que nesse dia ele dizia, todo vaidoso, usar calça e camisa da Brooksfield, tênis da Adidas e um boné também de marca. Herança de alguém, talvez.

    Voltemos ao restaurante. Zeca tomava já umas dez lapadas de aguardente, não parava de contar histórias e, com isso, fazia da nossa mesa a mais animada do ambiente. Quando o garçom foi servir a 11ª dose, eu quis saber que cachaça era aquela. Tomei um susto com a informação: era a mineira Havana, envelhecida 10 anos, e cada copinho custava... R$29,00!!! Zeca havia gostado do nome da cachaça e o garçom, malandro, daquele tipo que pensa que todo deputado é rico, escondeu o preço. E nem sabia que eu era ex-deputado.

    A vida, porém, é feita de recompensas. Paguei a conta satisfeito. Fiquei pensando na vida de Zeca Boca de Bacia. Sem dinheiro, sem emprego, sem rumo, boca-livre, esse andarilho das ruas de Campina Grande e que de vez em quando vinha a Brasília nas asas do favor alheio era feliz, divertido e irradiava alegria por onde passava. Eu não tinha motivos para permanecer na tristeza ante a derrota eleitoral. Deus haveria de me abrir outras portas. E abriu. Muitas. Aquele sábado com Zeca e sua Havana cara não teve preço.


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